LARA MORAIS
25 SETEMBRO 2008
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FICHA TÉCNICA
Diagramas
Desenho a grafite e carvão sobre as paredes e o chão.



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Lara Morais desenvolve, de uma forma sistemática, um questionamento sobre práticas do quotidiano. O seu trabalho encontra-se no limiar de uma postura crítica e política. As suas obras propõem, sob uma elaborada estrutura reflexiva, um segundo olhar sobre as tensões que partilhamos na sociedade em que vivemos, na qual a identidade e a alteridade se confrontam perante a diversificação de dispositivos, que constroem o nosso modus vivendi num contexto comum.
O espaço é uma categoria determinante na construção conceptual das suas obras, tornando-se por vezes o seu objecto central. É como uma plataforma que lhe permite articular uma rede de conexões denotativa da sua posição crítica.
O projecto exposto no emptycube é composto por dois momentos, um diagrama e uma superfície geométrica. A existência destes dois momentos não significa que há uma precedência, ou uma sucessão, de um em relação ao outro, mas duas formas de um processo dialéctico em que a artista indaga a validade das relações humanas como condição da identidade do sujeito nas determinações do espaço. O título Diagramas delimita de imediato uma necessidade, racional e prática, de estabelecer um sistema de orientação num universo de referências que se encontra aparentemente disperso. Neste projecto, em particular, a utilização da linguagem é absolutamente relevante. Em primeiro lugar porque introduz o universo processual da autora, numa relação estreita com a herança conceptual, convocando o espectador a deter-se em presença do texto, das palavras e das linhas que formam o diagrama. Este é como um esquema, ou um mapa, que enuncia um sistema de relações entre palavras que contêm um significado que deriva de diversas subcategorias escolhidas pela autora, a partir de um conceito comum mas abstracto, o espaço. Mas o Diagrama é para Lara Morais uma aproximação. Há uma certa dose de ironia nesta acção discursiva sobre o espaço, quando o lugar da exposição se chama emptycube, em português “cubo vazio”, que podemos associar a um espaço interior sem nada que o identifique, à inexistência de um corpo nesse espaço que o determine e o distinga de outros espaços vazios. Há também uma absoluta despreocupação e um despojamento perante a obrigatoriedade do objecto tridimensional, que determina efectivamente a divisão desse espaço, imposta pela sua presença.
A sala principal onde se encontra o objecto geométrico é a revelação do enunciado contido no diagrama. Um cubo, com um metro de aresta, alude à possibilidade objectiva de determinar um espaço na sala. É uma experiência deceptiva (e reflexiva) porque a sua existência só pode ser conhecida compreendendo a inscrição das projecções das faces do cubo nas paredes da sala. Se o cubo se destina a determinar uma posição, esse lugar que podemos procurar é encontrado por cada visitante, pela corporalidade da sua presença no momento em que ali se encontra. É a relação entre tempo e espaço sinalizada pelo instante transitório e irrepetível da presença do espectador. Esta é a metáfora da posse daquele lugar naquele momento, mas também a sua única possibilidade. Os Diagramas são uma tentativa que se desdobra no esquema de orientação construído e desenhado pela artista, e na forma geométrica que cada um terá de reconstituir, e desta forma confirmar a sua posição num determinado ponto do espaço e aí encontrar o seu lugar. A sala é pública mas o momento é individual e privado.
Lara Morais adverte-nos para a urgência do reconhecimento da identidade que cada um presentifica pela sua singularidade num determinado lugar. Essa determinação no espaço depende da distância relativa de um corpo a outro, e a sua posse reside na transitoriedade da sua presença.

João Silvério
Setembro 2008